A terceirização das categorias de base é uma prática cada vez mais presente no futebol brasileiro. Em todos os casos, o enredo é basicamente o mesmo: o clube encontra-se ‘quebrado’ financeiramente e não consegue gerir sua base, até que surge uma proposta (a princípio) tentadora de uma determinada empresa para assumir o controle das categorias inferiores em troca de muitos benefícios, como o custeamento de todas as despesas dos profissionais da base e investimentos em captação e estrutura para que o clube se torne ainda mais eficiente na prospecção de jogadores.
Mas toda essa fantasia sempre parece ficar apenas no discurso. Não faltam exemplos de como o modelo de terceirização tem comprometido o desenvolvimento da base de muitas equipes nacionais. Além de não “caminharem com suas próprias pernas”, os clubes ainda se veem em meio a inúmeros conflitos de interesses. A “vítima” mais recente foi o Paraná, que em 2007, assinou um contrato com a B.A.S.E. (Bom Atleta Sociedade Empresarial) visando a construção e manutenção de um Centro de Treinamento e o custeamento de despesas como salários e alimentação para jogadores e comissão técnica. Em troca, o clube cederia 50% dos direitos de todos os jogadores formados no Ninho da Gralha.
A parceria foi um fracasso. À época que firmou com a B.A.S.E, o Paraná já tinha uma ligação com outra empresa no time profissional, a L.A. Sports. Obviamente, o clube viveu maus bocados com a B.A.S.E. acelerando o processo de profissionalização dos “seus” jogadores e a L.A. tentando plantar seus atletas no clube. Depois de um tempo, a antiga parceira finalmente abandonou o clube, mas a B.A.S.E. começou a atrasar salários, indicando uma situação financeira delicada. O único lucro da empresa com atletas paranistas foi por meio da venda de Kelvin, onde embolsou R$ 600 mil. Muito pouco para quem investiu mais de 12 milhões de reais na construção do Ninho.
Resultado: a base paranista foi à falência e a gestão do Ninho da Gralha acabou cedida pela empresa. A parceria entre B.A.S.E. e Paraná durou somente quatro dos 20 anos previstos em contrato, o que ainda manterá o clube vinculado à empresa por mais de dez anos. René Bernardi, empresário paranista e um dos fundadores da B.A.S.E., exige ao menos que a empresa recupere o valor investido. Isso significa que parte das receitas do Paraná daqui pra frente, como venda de jogadores e cotas de TV, serão destinadas ao sócio. Não obstante, o Ninho passa a custar nada menos que 200 mil mensais aos cofres dos paranaenses. Alguém arrisca que o clube novamente correrá atrás de investidores para quitar a dívida - e acumular mais dívidas?
Outros clubes já viveram situações desagradáveis por conta da terceirização da base. O Paulista de Jundiaí, por exemplo, apostou em uma parceria com o Campus Pelé, que buscava se estabelecer no mercado brasileiro através de projetos “inovadores”, sobretudo na área educacional. Nada feito. No ano passado, a base do Galo passou por momentos de tensão com salários atrasados (incluindo 13º e férias) e greve dos funcionários. O Paulista, obviamente, se esquivou da responsabilidade, já que o Campus Pelé se comprometeu a gerir essas funções. No último mês de outubro, a parceria foi desfeita e o clube retomou o controle de direitos federativos e econômicos de boa parte dos atletas.
O Ituano viveu situação parecida com a chegada da Traffic, em 2008, onde acabou excluído das competições da FPF, passou a treinar em Porto Feliz e presenciou o clube virar um reduto de jogadores vinculados à empresa. Claro que o surgimento de uma proposta aparentemente vantajosa deixa o clube numa enrascada. Em meio a problemas financeiros, qualquer proposta para recuperar a base parece bem vinda. Ao mesmo tempo, perder autonomia na sua principal fonte de renda é um risco e tanto. As empresas fazem de tudo para lucrarem rapidamente com os prodígios e atrapalham o desenvolvimento dos jovens no time principal, o que tem efeito negativo no clube. Pensar a longo prazo exige cumplicidade de ambas as partes. Caso contrário, a terceirização é uma furada e tanto para os clubes.
Nota do Blog:
Reproduzi na íntegra o comenmtário do Gabriel Seixas. Quem atentar bem para o que se desprende dele talvez encontre aí as razões que levaram o presidente Maninho Durgante, do Cruzeiro E.C. a não querer mais a parceiria com a CRD Sports, claro, resguardando-se as proporções com clubes profissionais que disputam regularmente os campeonatos de suas federações.
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